Sankofa: O desafio do ensino do Design gráfico em Moçambique
Neste ensaio busco explorar o desafio que se tem enfrentado no processo de ensino e aprendizagem de Design Gráfico em Moçambique. Para tal, será necessária a compreensão do significado de Sankofa, que é uma palavra proveniente da língua twi ou axânti composta pelos termos san, que é “retornar; para retornar”, ko, que significa “ir”, e fa que quer dizer “buscar; procurar”. Pode ser traduzida como “Volte e pegue”. (www.dicionariodesimbolos.com.br)
Neste contexto Sankofa vai significar retornar do passado para ressignificar o presente e melhor perspectivar o futuro. Ainda nesta lógica, “nunca é tarde para voltar e apanhar o que ficou perdido”. Sankofa é um ideograma pertencente ao adrinka do povo acã, um grupo étnico de Gana – um entre vários países do continente Africano.
Torna-se relevante destacar este ideograma, porque iremos contextualiza-lo como um símbolo de reconstrução histórica nesta abordagem. Esse regresso visa buscar o que ficou perdido. De nada adiante andar aos passos altos e rápidos, principalmente, nesta era em que a comunicação tende a “globalização”, sendo que, existe uma parte nossa – africana – que ficou corrompida durante a colonização. Na tentativa da busca pela “parte perdida” não há intenção em negar a influência externa que se tem sobre o design, pelo contrário, o objectivo é conciliar o conhecimento existente sobre design com os problemas e soluções locais baseadas nas técnicas, ideologias, crenças e invenções não referenciadas na história do design sobre os povos africanos e, em algum momento, designers afros espalhados por diversos cantos do mundo que raras as vezes foram e são destacados como referência histórica de design.
No acto do ensino e aprendizagem de design em geral, mais em específico design gráfico, em qualquer parte do mundo, é imprescindível a abordagem histórica sobre a origem da Arte e Design, como a premissa para a construção da base do conhecimento necessário de um profissional que trabalha na articulação da comunicação visual.
A essência da história de design não é sobre o design em si. É sobre ideias e cultura (Parasad Boradkar apud The Education of a Graphic Designer, 2005, p. 84). Numa tentativa de análise do surgimento e prática de Design gráfico em Moçambique podemos identificar o primeiro momento da sua origem, historicamente considerada universal, cuja origem foi provocada pela revolução industrial Europeia, que por sua vez deu origem a segunda revolução industrial, só que desta vez em África – após a conferência de Berlim. Portugal conseguiu a declaração da ocupação efectiva das suas colónias que influencia posteriormente a introdução de máquinas e veiculação de informações visuais no âmbito económico e política (campanhas publicitárias e jornais), nas suas colónias como o Moçambique.
Podia se questionar o porquê de não se considerar a história contada numa perspectiva ocidental como sendo universal e válida para todas as culturas, povos africanos, neste caso, especificamente moçambicanos. Na minha opinião a partir do momento que a história de design é mais sobre ideias e a própria cultura que reflecte as mesmas; para um povo que foi subjugado e renegado a sua cultura – hábitos, costumes e crenças – é importante, hoje, resgatar a substância que lhes compunha ou que lhes compõe, não para agir de acordo com aqueles padrões, mas para conhecer a sua verdadeira história de comunicação visual sob ponto de vista próprio, e não só consumir conteúdos forasteiros, mas para ter o poder também de partilhar uma visão própria sobre a percepção que se tem sobre design.
Podia se questionar ainda sobre a relevância de todos esses factores no processo de ensino e aprendizagem de Design Gráfico; entre várias respostas que se possam dar, a importância de um repertório diversificado e local é, por si só, bastante relevante para (i) a noção dos recursos a sua volta e diferentes formas de enxergar uma solução que seja aceite, primeiro localmente e por último universalmente; (ii) Sendo design uma linguagem, a articulação da mesma pode ganhar formas numa perspectiva inerente ao próprio designer, concebendo e convencendo, neste caso, uma ideia objectiva geral como resultado da noção da continuidade da sua actividade em relação aos designers do passado – os artistas que tinham a função de conceber uma peça gráfica como meio de estabelecer comunicação visual para um determinado grupo, que consequentemente servia como marca distintiva de uma entidade, ou grupo social.
Nelson Mandela percebeu a essência da comunicação, contextualizando ao que pretendemos alcançar, dizendo que “Se você falar com um homem numa linguagem que ele compreende, isso entra na cabeça dele. Se você falar com ele em sua própria linguagem, você atinge seu coração.” Portanto, considerando que design gráfico é uma actividade intelectual que busca solucionar problemas sociais de um determinado grupo, povo, neste caso, é crucial que se pense numa história dos artefactos, por exemplo, do uso diário por esse povo, que chegamos a chama-los de objectos rústicos e até objectos tradicionais. A relação simbólica – as emoções, conexões que suscitam a compreensão e posteriormente o uso intuitivo – dos objectos, pontos e combinações de cores são algumas características dos elementos representativos extraídos da realidade que podem reflectir a essência de uma cultura na comunicação visual.
Portanto, torna-se cada vez mais necessário um registo das actividades praticadas cá, pois bem, não podemos esperar receber tudo, inclusive, o que é concernente a nós dos outros para que possamos estar informados. É chegada a hora de registar e promulgar a nossa visão de design gráfico e, não com o objectivo de sermos vistos como revolucionários ou vítimas, mas como um povo autónomo capaz de colocar a sua visão e poder contribuir positivamente sobre a comunicação visual e poder interagir com os demais países que já estão afrente no campo de Design Gráfico. É a hora de redefinir os conceitos globais para uma perspectiva mais local para podermos interagir com os demais no mundo a fora.